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Intertexto, cópia, tradução ou plágio? Pesquisadora mostra que Machado de Assis pode ter plagiado periódico francês

Intertexto, cópia, tradução ou plágio? Pesquisadora mostra que Machado de Assis pode ter plagiado periódico francês

Recentemente, um artigo levantou a polêmica sobre um suposto plágio de Machado de Assis, envolvendo um texto que ele escreveu aos 21 anos.

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Recentemente, um artigo levantou a polêmica sobre um suposto plágio de Machado de Assis, envolvendo um texto que ele escreveu aos 21 anos. Publicado no periódico "A Marmota", o texto descreve um matadouro nos Estados Unidos usando máquinas a vapor, com base no relato de Oscar Comettant. Porém, a pesquisadora Élide Valarini Oliver, da Universidade da Califórnia, aponta que Machado se baseou, na verdade, em um periódico francês, e não diretamente na obra de Comettant.

Então seria intertexto, cópia, tradução ou plágio? Entendamos a diferença:

INTERTEXTO: Refere-se à relação entre diferentes textos, onde um texto faz referência a outro, criando um diálogo entre eles. Isso pode ocorrer por meio de citações, alusão a temas, ideias ou estruturas.

CÓPIA: Reprodução exata ou quase exata de um texto ou parte de um texto. Não se trata de um simples ato de transcrever, mas pode envolver a replicação de conteúdo sem a devida autorização ou adaptação.

TRADUÇÃO: É o processo de converter um texto de um idioma para outro, mantendo o significado, estilo e nuances do original.

PLÁGIO: Prática de usar o trabalho, ideias ou palavras de outra pessoa sem dar o devido crédito, apresentando-o como se fosse próprio. É considerado uma violação ética e legal.

O artigo de Élide, intitulado "Machado de Assis: de Porcos e Plágios", explora como Machado teria utilizado o conteúdo do periódico francês L’Année Scientifique et Industrielle, ao invés de citar diretamente o livro de Comettant. A pesquisadora destaca que há uma coincidência de termos e trechos entre o texto de Machado e o periódico francês, incluindo descrições detalhadas e até notas de rodapé, sem as devidas citações. Isso levanta questões sobre a prática de "tradução" ou "intertextualidade" que Machado poderia ter empregado.

Élide questiona se a reescrita de Machado, ainda que com variações estilísticas, realmente transforma o texto em uma obra original ou se configura como plágio disfarçado. O debate se expande para além de Machado, abrangendo conceitos de imitação e transformação presentes na literatura desde Aristóteles a T. S. Eliot.

O periódico francês:

“A usina do Sr. Boviello, diz o Sr. Oscar Commettant em sua obra sobre os Estados Unidos, se compõe de quatro grandes corpos de edifícios ligados todos por pontes suspensas. Mais longe, como planícies vivas que vai a devorante máquina ceifar, estão encerradas inumeráveis varas de porcos pertencendo a diferentes proprietários que os levam a essa usina como levamos o trigo ao moinho para moê-lo.”


Machado:

“O estabelecimento de que vamos tratar, vasto, como deve de o ser para estrangular diariamente centenas de porcos, compõe-se de quatro extensas casas que se comunicam entre si por pontes pênseis. Ao redor, e em todos os sentidos, se distinguem diversos cercados, fechados, onde formigam inumeráveis porcadas pertencentes a diferentes criadores.”


Analisemos outro exemplo na mesma obra.

O periódico francês:

"A um sinal do mecânico chefe, levanta-se uma báscula que se comunica com a entrada de um primeiro compartimento da máquina chamado de degoladouro, e a operação de destruição começa. Os porcos, muito apertados uns contra os outros, vendo uma saída, se precipitam no corpo do estabelecimento até um corredor estreito, onde eles não podem senão passar um a um. Parados ali um instante, eles têm o pescoço atravessado por facas enormes movidas pelo vapor como todo o resto da máquina. O porco, degolado em menos de um segundo, é preso pelas pernas traseiras e arrastado violentamente por grampos que o levantam a uma certa altura. Lá, ele fica suspendido um instante e passa mais além por uma balança móvel, sem cessar em movimento, que mergulha o animal num poço de vapor e acaba por sufocá-lo escaldando-o."


Machado:

“O engenheiro em chefe faz um sinal; abre-se logo a comunicação do exterior para o primeiro compartimento da máquina chamada degoladouro. O ingresso para esse compartimento é feito por um estreito corredor, que se afunila e só pode chegar ao compartimento de que se trata um porco por sua vez. Ao termo desse corredor são os porcos obrigados a parar, e logo com rapidez de raio, enormes facões manejados por um punho tão forte, como o do vapor, os traspassem certeiramente a sangrar pelo coração. Quanto pode a mecânica! Isso feito, sem demora, cada porco é agarrado pelos quartos traseiros por grampos, e assim violentamente levantados e conduzidos em enfiada, como um rosário, para serem mergulhados em um vasto reservatório de água fervendo, donde saem para sofrerem o processo final da pelação entre grandes escovas.”.


E pra você, o texto do Machado de Assis é um plágio ou uma coincidência?


Fonte: https://jornal.usp.br/cultura/intertexto-copia-traducao-ou-plagio-pesquisadora-mostra-que-machado-de-assis-pode-ter-plagiado-periodico-frances/.